Diogo Sallaberry / Agencia RBS Um gaiteiro que conseguiu criar seu próprio estilo dentro da música gaúcha e um amigo para todas as horas. É assim que artistas da música tradicionalista e do Estado definem Porca Véia, que morreu nesta sexta-feira (12), aos 68 anos. Durante sua trajetória, ele gravou 21 CDs e três DVDs, recebeu dois discos de ouro e marcou presença em bailes e em festivais em todo o sul do país. Por isso, a trajetória de Porca Véia é vista como uma grande perda para a música regionalista.
— O baile e o sul do país estão de luto, e a saudade que vai deixar para os amigos. Enquanto a gente não se despede, não falamos em saudade, porque a cada contato que tínhamos a vontade era de saber notícias. Por isso, hoje, a primeira coisa que senti quando lia a notícia do adeus, foi só a saudade — lamenta o músico gaúcho e compositor Luiz Carlos Borges.
Para o músico Marcelo Caminha, o artista se destacou por sua simplicidade ao retratar a cultura gaúcha — e isso o cravou na história da música regionalista:
— A música galponeira antiga segue como referência para todos nós. E, claro, temos um clássico dele na voz do Telmo, que foi imortalizada, Lembranças, que está na memória e no ouvido de cada gaúcho dessa querência e também nas mãos desse grande gaiteiro que nos deixa.
Amigo dele desde a década de 1980, o músico João Almeida Neto conta que sua relação com Porca era uma irmandade:
— Começamos juntos na música e era um cara extremamente solidário. Me emprestou o carro para ir tocar em festivais bem longe da minha casa, foi uma porrada na minha vida hoje. Ele nos deixar com 68 anos é muito cedo — lamenta Neto.
A mesma relação de irmandade acompanha a relação de Porca Véia e o empresário musical Marcos Kraeff, que fez uma boa relação do nome artístico do amigo.
— De Porca, ele não tinha nada (risos) Ele era extremamente cuidadoso com família, sempre com muito capricho, de zelar, de guardar para o futuro. Um cara que é inexplicável, sincero e que enxergava o que está dentro do coração da pessoa, não tem maldade nenhuma — reforça Kraeff.
Porca também é lembrado, principalmente, por ter dado sequência ao sistema da escola serrana de tocar, próxima da linha de Os Bertussi. Segundo Renato Borghetti, o músico conseguiu "dar o molho dele" e se tornou referência entre os gaiteiros:
— Ele foi um músico de exceção, muito alegre e todo mundo gostava de ter ele em casa. E não só pela gaita, para animar, mas sim porque era divertido, nos sentíamos bem de ter ele próximo com as conversas maravilhosas. É um momento triste para a música do Rio Grande do Sul e do Brasil.
Luiz Carlos Borges "Foi um grande amigo, e mesmo sendo uma figura que não convivi diariamente, por causa dos nossos caminhos - ele no baile e eu mais com show - sempre foi uma amizade de coração. O lado artístico tem duas formas de interpretar: o baile está de luto, em geral, o Rio Grande do Sul, todo o sul brasileiro. Ele foi um dos que mais representou a musica regional do sul, indo até Goiás, Mato Grosso do Sul... Acho que ele abre um buraco, um rombo na nossa música, já que ele teve a mesma claridade que os Serranos, por exemplo, na música de baile. Ele é um grande discípulo da musica dos Bertussi, talvez tenha sido o maior representante, ele seguiu com uma dedicação muito séria. Ele criou um estilo dele, não chega ser um cover dos Bertussi, ele seguiu criando as composições dele, por saber onde estavam as músicas boas. O Porca pegou muito bem a compreensão do que precisava fazer com a carreira. Às vezes, se é bom, caipira, mas administra mal a carreira e pior quando é um grupo. Ele administrou com sabedoria, tinha muitos bailes.Porca era silencioso, brincalhão, tem um histórico que dá pra escrever um livro. Era um criador de muitas pegadinhas, pequenos provérbios gauchescos, portanto era espontâneo. O que a gente mais tem a dizer é sobre a arte e o grande homem que ele foi. (...) O baile e o sul do país estão de luto e a saudade que vai deixar para os amigos. Enquanto a gente não se despede, não falamos em saudade, porque a cada contato que tínhamos a vontade era de saber notícias. Por isso, hoje, a primeira coisa que senti quando lia a notícia do adeus, foi só a saudade."
Marcelo Caminha "Um grande artista gaúcho se foi. O Porca Véia foi um cara, além de grande pessoa, todos gostavam dele, muito incentivador dos colegas, uma figura humana espetacular. Ele trouxe para a cultura gaúcha um jeito de tocar acordeão e cantar retratando a simplicidade da cultura gaúcha, que vem dos gaiteiros antigos, lá do campo. O Porca conseguiu de um jeito simples trazer este retrato da música galponeira antiga, que hoje segue sendo uma referência para todos nós que fazemos uma música mais elaborada, técnica. E, claro, temos um clássico dele na voz do Telmo, que foi imortalizada, 'Lembranças', que está na memória e no ouvido de cada gaúcho dessa querência e também nas mãos desse grande gaiteiro que nos deixa."
João Almeida Neto "Do ponto de vista pessoal, é uma perda irreparável, pois éramos muito amigos, mas não é essa retórica de ser colegas de música, era de irmandade mesmo. Nós tivemos episódios que justificaram um para o outro uma amizade, solidariedade, parceria enorme, uma união, uma proteção recíproca, então para mim fica até difícil falar como artista. O público sabe o valor que tem como artista, como foi importante, com o estilo dele, com a forma dele conduzir o baile. Fomos parceiros de música, de briga, de bebedeira, de viagem, de todo o tipo de relação, de dois jovens que se gostam podem ter. Começamos juntos na música, no final da década de 1970, e o desenlace da minha vida profissional com a música se deu junto com a dele. Nós eramos uma gurizada que tocávamos naqueles barzinhos de Porto Alegre. Lembro sempre da primeira edição do Musicanto de Santa Rosa, em que nos apresentamos com 'Vozes Rurais'. O Porca foi considerado o melhor instrumentista do festival. (...) A gente descobriu o mundo da música mais ou menos juntos, tem detalhes que demonstravam o extremo carinho por mim e eu por ele, coisas de como me entregar o carro dele para eu viajar até Uruguaiana, por exemplo, para me apresentar. Foi uma porrada na minha vida hoje. Ele nos deixar com 68 anos é muito cedo. Para mim, o Porca tinha duas qualidades marcantes: ele era um cara extremamente solidário e um cara de um astral do caralho, sempre contando uma piada."
Renato Borghetti "O Porca, na realidade, deu sequência a um sistema de uma escola serrana de tocar, talvez a linha dos Bertussi, ele fez escola e conseguiu dar o molho dele. Hoje, o Porca é referência entre tocadores de gaita. É um musico veio de exceção, sem dúvida alguma, uma perda grande para a gente. Um grande amigo. Eu não sou tocador de baile, mas os únicos que toquei foi com ele - 30 e poucos anos atrás a gente montou um trabalho pra tocar fandango."