01/12/2023 às 11h13min - Atualizada em 01/12/2023 às 11h13min
Argentina continuará atrativa para turistas brasileiros após posse de Milei, analisam especialistas
GZH
Luis Robayo / AFP Até setembro deste ano, o país havia recebido cerca de 5,3 milhões de visitantes estrangeiros, segundo maior número em pouco mais de uma década
Apesar das incertezas que cercam a posse do novo presidente eleito da Argentina, especialistas acreditam que o país deve continuar sendo atrativo para os turistas brasileiros em 2024. Isso porque a expectativa é de que o cenário de desvalorização do peso não mude significativamente no primeiro ano de governo. Também se espera que o alto potencial econômico do turismo seja considerado na tomada de decisões pelo economista ultraliberal Javier Milei.
Somente até setembro, a Argentina havia recebido mais de 5,3 milhões de visitantes estrangeiros — o segundo maior número do período em 13 anos, conforme divulgado pelo Instituto Nacional de Promoção Turística (Inprotur). O país também registrou a maior entrada de turistas do Brasil por via terrestre desde 2010: foram cerca de 337,5 mil pessoas em nove meses.
Considerando todos os meios de transporte, 1.025.854 brasileiros foram para a Argentina entre janeiro e setembro deste ano, conforme a editora Panrotas — número que representa quase 20% dos visitantes do país no período. E a tendência para os próximos meses é que a presença de pessoas do Brasil por lá continue forte.
Um levantamento recentemente, realizado pela Booking.com, apontou Buenos Aires, na Argentina, como o destino internacional mais buscado por brasileiros para viagens entre novembro deste ano e janeiro de 2024.
Cenário econômico
Pedro Dutra Fonseca, pesquisador e professor do Departamento de Ciências Econômicas e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), explica que a ida ao país está atrativa para os turistas do Brasil porque o peso está muito desvalorizado, o que faz com que a taxa de câmbio da moeda argentina em relação ao dólar e ao real seja muito baixa.
De acordo com o especialista, na Argentina, há três tipos de dólar que interessam para os turistas brasileiros. O primeiro é o oficial do governo, que é utilizado para importações, exportações e negócios; o segundo é o blue, que é o paralelo, usado para fazer o câmbio com os cambistas. O terceiro é o MEP (mercado eletrônico de pagamentos), também chamado de dólar turista, que é utilizado por visitantes que fazem compras com cartões. Na tarde desta quinta-feira (30), a cotação do oficial estava em 378,37 pesos, enquanto a do blue e do MEP eram de 895 pesos e 964,84 pesos, respectivamente.
— O peso oscila diariamente, mas sempre desvalorizado. Isso porque a Argentina tem um problema crônico de balanço de pagamentos, que é o balanço que se faz da entrada e saída de dólares de um país. Então, a Argentina tem um déficit crônico, ou seja, falta dólar e a inflação é muito alta. O país também tem pouca credibilidade, porque a ideia é que eles não conseguem exportar. Para gerar dólar, tem que exportar mais ou ter empresas estrangeiras que levem dólar para o país, o que depende da credibilidade — contextualiza o professor.
Além disso, Fonseca comenta que os argentinos têm a tendência de poupar dólar para se precaver das crises, o que também colabora para que a moeda estrangeira seja algo muito raro no país, gerando o déficit crônico. Outro ponto que completa a equação da atratividade é que o Brasil tem um cenário oposto, com uma tendência a valorizar o real, baixar a inflação, entrar dólares e aumentar os investimentos estrangeiros.
É nesse cenário de crise econômica que Milei tomará posse, em uma cerimônia programada para ocorrer em 10 de dezembro. Por isso, um dos planos defendidos pelo presidente eleito é o de “dolarização da economia”.
— Dolarizar tem dois sentidos. Um seria fechar o Banco Central e fazer com que os argentinos passem a usar o dólar como moeda, em vez de peso. Mas não tem dólar suficiente para isso. Outra coisa que ele poderia fazer era fixar o dólar oficial em um valor mais alto. Mas qualquer cenário é de incerteza, porque não se sabe exatamente o que o Milei fará — pontua.
Expectativa para o futuro
Assim, o professor acredita que o mais provável é que, pelo menos a curto prazo, as viagens para a Argentina continuem valendo a pena para os brasileiros, em especial porque o problema de balanço de pagamento “dificilmente vai se resolver da noite para o dia”. Portanto, em sua visão, o cenário não deve se alterar muito em 2024, permanecendo vantajoso para turistas do Brasil que queiram visitar, fazer compras, se hospedar e ir a restaurantes:
— É uma coisa mais complicada. Esse problema da falta de dólar na Argentina é estrutural. Então, como vai fazer para entrar dólares no país? Ele teria que exportar mais, importar menos. Teria que ter uma recessão muito grande e credibilidade externa para os empresários voltarem ao país. Isso não é fácil de resolver da noite para o dia. O cenário mais provável é que, mesmo que ele encaminhe um plano mais racional para a economia, o efeito não seja tão imediato.
Paulo Gusmão, diretor do Sindicato das Agência de Viagens do Rio Grande do Sul (Sindetur-RS) e CEO da operadora Galápagos Tour Ltda., se diz otimista em relação às viagens de 2024 para o território argentino, principalmente se o governo mantiver uma política de turismo semelhante a que existe e se não cumprir o plano de dolarização da economia:
— Se dolarizar, acho que pode ficar ruim para nós. Agora, se o peso se manter como está e baixar um pouco a inflação, eu acredito que continue bom. Temos bastante procura para 2024 e eu acredito que vá permanecer como está ou até melhorar para os brasileiros.
Na visão do diretor do Sindetur-RS, Milei deve tomar decisões favoráveis ao turismo, já que o setor também movimenta a economia do país. Ele garante que houve um crescimento na procura por viagens para a Argentina nos últimos anos, mas ressalta que a rede hoteleira ainda não está tão barata quanto o esperado e que há um grande problema em relação ao alto custo das passagens aéreas — por esse motivo, muitos visitantes têm optado por viajar de carro.
— O restante, está barato. As tarifas de serviços estão muito boas e a alimentação também está com preços muito atrativos — comenta Gusmão.
Três destinos da Argentina concentram a maior demanda atualmente, conforme o diretor: a Patagônia, a região de Bariloche e a região de Mendoza.
— Estou otimista porque estamos recebendo muitos pedidos de grupos. E o número de pedidos não reduziu após a eleição, a procura está superboa. Então, não tem como não ficar otimista — finaliza.