18/08/2023 às 10h42min - Atualizada em 18/08/2023 às 10h42min

Polícia combate facção suspeita de ameaçar comerciantes no Vale do Sinos e cobrar por serviço de segurança

Gaucha ZH
A Polícia Civil volta a realizar operação para combater um esquema de extorsão contra comerciantes do Vale do Sinos. No mês passado, sete suspeitos, que também cobravam por suposto serviço de segurança para moradores de condomínio, foram presos. Em março, o líder de uma quadrilha foi detido na Região Metropolitana depois que investigadores identificaram pelo menos 32 vítimas.
Nesta sexta-feira (18), 125 agentes cumprem cinco mandados de prisão preventiva, 21 de busca e apreensão, além do sequestro judicial e bloqueio de R$ 3,9 milhões em imóveis, veículos e valores depositados em oito contas bancárias. As ordens judiciais ocorrem em Novo Hamburgo, Sapiranga e Campo Bom. Até as 8h, quatro pessoas haviam sido presas, sendo uma em flagrante. O suspeito estava com arma e munição. Junto com um dos criminosos, a polícia encontrou R$ 4 mil, dinheiro provavelmente obtido por meio das extorsões. Os agentes localizaram na casa de um dos presos, dentro de um quarto de criança, um esconderijo estilo bunker. Ao todo, R$ 20 mil foram apreendidos na ofensiva.
Desta vez, o titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) de São Leopoldo, delegado Ayrton Martins Figueiredo Júnior, diz que uma outra parte da organização criminosa é alvo da ofensiva. Um grupo de 11 investigados estaria cobrando, inicialmente, R$ 500 mensais, mas depois os valores chegaram até R$ 1,5 mil, somente de comerciantes que atuam à noite, como bares e casas de prostituição.
Segundo inquérito, cinco proprietários registraram ocorrência desde o ano passado, todos, inicialmente só por ameaças, mas depois confirmaram a extorsão ao terem valores exigidos mensalmente. No entanto, Figueiredo Júnior acredita que são dezenas de vítimas em Novo Hamburgo, Campo Bom, São Leopoldo, Sapiranga e ainda em Dois Irmãos. A polícia diz que as vítimas têm medo de procurar a polícia. 
A investigação teve início após denúncias, principalmente depois das ações anteriores deste ano contra outra célula da organização criminosa que extorquia outros tipos de comerciantes e até condôminos da região. Os contatos foram feitos pelo WhatsApp da Draco de São Leopoldo, que tem o seguinte número: (51) 98585 6118.  Figueiredo Júnior destaca que conseguiu as provas deste crime que, segundo ele é semelhante ao que a máfia faz, relativas ao período de dezembro de 2021 a janeiro de 2022. Mas ele já tem informações e, por isso ocorrem nesta sexta mandados de busca e apreensão em busca de mais provas, de outros casos.
O delegado comprovou que as extorsões ocorriam em larga escala mediante ameaças, agressões e até mesmo estabelecimentos depredados ou incendiados. Todos estes fatos envolvendo esta suposta segurança imposta pelos criminosos levou a polícia a deflagrar nesta sexta a chamada "Operação Timeo", que quer dizer medo em latim.
De acordo com o delegado Eduardo Hartz, diretor da 3ª Delegacia Regional Metropolitana (DRM), a operação também teve por objetivo combater a lavagem de dinheiro procedente das extorsões.
—Estamos descapitalizando estes grupos que usam estas práticas justamente para monetizar o tráfico. Isso tem ocorrido aqui no Vale do Sinos desde 2021. O crime de extorsão é uma forma de capitalização das organizações criminosas, por isso a importância desta operação —conclui.
Quem não paga, é ameaçado
A polícia diz que já tem conhecimento de outras ocorrências, além das cinco registradas na Draco, mas afirma que é preciso fazer um levantamento preciso para que possam ser atribuídas ao esquema criminoso. Figueiredo Júnior também acredita que, com a divulgação deste caso, mais pessoas tenham coragem de denunciar a facção.
O delegado, ao ressaltar que a investigação teve início após compartilhamento de informações com a Polícia Federal e a Justiça Federal, diz que obteve vários áudios  — mas com permissão de divulgar apenas as transcrições  — que mostram uma divisão de tarefas entre os integrantes desta célula da facção com base no Vale do Sinos.
Os crimes de extorsão são comandados por dois foragidos da Justiça, apontados como líderes da organização criminosa. Toda semana são enviados para eles valores arrecadados com o serviço ilegal de segurança. Outro foragido, mas subordinado aos dois primeiros, é responsável por executar as extorsões. Segundo o delegado, a parte violenta dos crimes é realizada por mais dois suspeitos. Todos com mandado de prisão neste inquérito que deu origem à operação.
 — Eles usam de todos os meios de intimidação e violência para empreender sucesso na prática criminosa. Também são responsáveis por recolher os valores pagos e identificar novos locais que podem ser alvos de extorsões. Nos locais onde o responsável não aceita fazer o pagamento da propina, a ameaça e a consequente violência, ataques com pedras, tiros e até incêndios, aumentam, até ocorrer, como ocorreu, um assassinato  — explica Figueiredo Júnior.
Além disso, as vítimas das extorsões sempre realizam os pagamentos em dinheiro ou por meio de Pix. Quando é em dinheiro, o criminoso subordinado aos dois líderes vai pessoalmente ao estabelecimento comercial durante a noite. Quando é via Pix, os investigados alternavam as chaves de pagamento. É neste ponto que entram os outros seis investigados, totalizando 11. São laranjas que emprestam suas contas bancárias.
Depois disso, parte do dinheiro é lavado em nome de terceiros ou usado entre os integrantes do grupo para compra de bens, como carros e imóveis. Mas também houve parte dos valores usado para despesas pessoais dos criminosos e capitalização do tráfico de drogas e de armas. Além das seis contas bancárias dos laranjas, outras duas de familiares diretos dos suspeitos foram identificadas. A Draco contabiliza que a lavagem de capitais deste esquema movimentou pelo menos R$ 4 milhões.
"Tem que pagar, todas têm que pagar"
A polícia divulgou, por meio de transcrições, o teor de alguns áudios durante conversa entre os cinco foragidos. Em alguns deles, um responsável por fazer as cobranças dizia o seguinte para um dos dois líderes do esquema:
"Tem que pagar e todas têm que pagar. Pode se atirar no colo do Papa, do bispo, de quem for. Pode mandar vir na fita, pode me chamar. Pode dizer, ó, eles tão te cobrando. Se o Papa vim, o Papa vai ter que pagar por eles, entendeu? Quando tá decretado, tá decretado. Aí não tem carinho pra ninguém. Nós vamos ir aí e vamos falar com eles, se eles não quiser pagar daí, nós vamos passar a visão pros guris e os guris vão ver o que vão fazer"
Em outra transcrição de áudios, o mesmo responsável pela cobrança fala com os responsáveis pelas ameaças e ataques:
"Ô meu, eu falei pra ela, não tem, não tem embolamento certo mano, é o homem que mandou cobrar cara, não tem, vem direto do homem. Se tiver algum embolamento que se queimar ali, é só vim na linha, que vou botar a falar com o homem. Daí o homem já vai botar no lugar. Só lamento que, se não pagar, daí fecha né mano".
Em outra gravação transcrita, um dos criminosos dá o seguinte recado para o dono de um dos estabelecimentos comerciais do Vale do Sinos, extorquido para pagar pela suposta segurança:
"Ô, tem uma notícia ruim pra te dar. Amanhã, mandaram fazer uma varredura em Novo Hamburgo todo, todo. Tem um cara aí que conhece todas, todas as malocas. E ele indicou a casa de vocês amanhã. Amanhã vai eu notificar todas as casas, pra, a partir de sexta-feira, pagar os 500 reais. Infelizmente a tua tá no caderno".
Cronologia dos crimes
No dia 24 de março deste ano, o líder de outra célula que integra a mesma facção foi preso em Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana. Ele foi, segundo a polícia, responsável por dois ataques, em Estância Velha, a vítimas que não quiseram pagar pelo suposto serviço de segurança oferecido pelos criminosos. Outros cinco suspeitos de integrar o grupo dele foram investigados e responsabilizados em inquérito policial.
Dias antes, em Taquara, havia sido preso um integrante de outra quadrilha que adotou a mesma prática no Vale do Paranhana. Nesta região já há oito presos desde o ano passado, mas também são poucas as pessoas que procuraram a polícia. Foram somente quatro nos últimos dois anos. No final de 2022, seis integrantes de organização criminosa que agiam na região extorquindo donos de empresas foram condenados a 61 anos de prisão. Ao todo, a Polícia Civil chegou ao número de 32 vítimas, pelo menos oficialmente.  
A polícia prendeu no dia 18 de julho deste ano sete pessoas suspeitas de envolvimento no mesmo tipo de extorsão contra comerciantes e também moradores de condomínios residenciais do Vale do Sinos. A suspeita é de que outros integrantes da mesma facção, portanto, uma outra célula, tenham lesado vítimas em mais de R$ 2,5 milhões em oito meses.
Dos sete presos, três eram homens, com diversos antecedentes criminais, que já estavam na Penitenciária Estadual do Jacuí. Outras quatro eram mulheres, sem passagem pela polícia, mas que foram presas por suspeita de receber e transferir dinheiro do grupo criminoso. As buscas ocorreram em São Leopoldo, Novo Hamburgo e Campo Bom.

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