13/06/2024 às 08h59min - Atualizada em 13/06/2024 às 08h59min

Saiba quem são os políticos e servidores suspeitos de desvio de doações aos atingidos pela enchente

Gaucha ZH
Ministério Público / Divulgação
Irregularidades na distribuição de donativos aos flagelados viraram prioridade no Ministério Público (MP) e na Polícia Civil neste momento de catástrofe gerada pela maior enchente da história do Rio Grande do Sul. Desde a última semana de maio foram realizadas seis ações contra desvios de finalidade nas doações por parte da agentes públicos, em cinco municípios.
Nesses episódios, são investigados 15 políticos ou servidores municipais, além de pelo menos 12 pessoas sem cargo público, que teriam se envolvido em irregularidades nos repasses.
Na esfera criminal, os suspeitos são investigados por delitos como apropriação indébita, peculato e associação criminosa. No campo eleitoral, alguns podem responder por abuso de poder econômico e propaganda eleitoral antecipada (o uso promocional de distribuição de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo poder público em favor de candidato, partido ou coligação pode resultar em prisão e cassação de candidatura).
Confira abaixo quem são os principais agentes alvos de buscas e apreensões realizadas pelas autoridades e quais as suspeitas.
Alvorada
Quantos: 11 investigados
Operação da Polícia Civil apurou suposto desvio de donativos. Entre os investigados, está o vice-prefeito Valter Luiz Slayfer (PSDB). Também foram alvo de busca e apreensão um secretário, uma assessora técnica, uma superintendente de secretaria e um representante do Legislativo, além de seis pessoas sem cargo público.
A polícia monitorou material sendo descarregado em centros oficiais de distribuição e flagrou itens sendo retirados destes locais por carros particulares e entregues em endereços que, conforme a investigação, não foram atingidos pela enchente.
Após a operação, o MP recomendou ao prefeito de Alvorada, José Arno Appolo do Amaral (MDB), que o município apresente plano de gerenciamento dos donativos, enviando relatório periódico à instituição.
Por meio da assessoria do gabinete, Slayfer informou que está à disposição para prestar esclarecimentos de forma transparente. Aguarda ainda o andamento das investigações e reafirma o seu compromisso com a verdade.
Barra do Ribeiro
Quantos: três investigados
O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MP investiga suposto desvio de suprimentos enviados pela Defesa Civil estadual. Os donativos foram entregues em uma entidade cultural.
Um dos investigados é o vereador Juliano da Silva Duarte (União Brasil), pré-candidato à reeleição, que teria ajudado na entrega das doações recebidas pela entidade. A suspeita é de que parte do material tenha sido destinada a pessoas que não foram atingidas pela cheia.
Três suspeitos foram alvo de ação, em 23 de maio. A operação ocorreu no local onde estavam armazenados os itens desviados e na casa de dois suspeitos.
Ouvido pela reportagem, o vereador admite que trabalhou na entidade cultural onde estavam armazenados os donativos, "mas como voluntário". Ele assegura que só entregou donativos a pessoas flageladas pela enchente.
Cachoeirinha
Quantos: pelo menos cinco investigados
Na primeira investigação, o Gaeco rastreou carreta que descarregou doações vindas de cidade de Santa Catarina em depósito que não é ponto de coleta oficial. Os donativos foram apreendidos.
Três suspeitos são investigados. Eles estão relacionados a uma ONG ligada ao vereador Deoclécio Lourenço de Mello (PSDB), candidato à reeleição.
A família do parlamentar nega irregularidades e alega estar cadastrada junto à prefeitura para receber e distribuir doações às vítimas da chuva.
Na segunda investigação, a Procuradoria da Função Penal Originária do MP aponta sobrepreço e superfaturamento na aquisição de bens. No caso, os bens, especialmente cestas básicas, deveriam ser destinados ao atendimento das vítimas da enchente.
O caso foi revelado em reportagem de Giovani Grizotti, do GDI, que mostrou que uma distribuidora cobrou, por mercadorias fornecidas à prefeitura, preços até 2.500% superiores ao valor praticado em supermercados.
O MP realizou buscas nas instalações da prefeitura, bem como nas residências e empresas de investigados, onde foram apreendidos documentos e equipamentos eletrônicos.
Entre os alvos está o prefeito, Cristian Wasem Rosa (MDB). A prefeitura mandou nota à reportagem:
"Anteriormente a qualquer notícia jornalística, no dia 25 de maio, fora determinada abertura de processo administrativo para apuração de possíveis irregularidades, que virou uma sindicância administrativa. A sindicância está realizando seus trabalhos de auditoria das compras. (...) Em breve teremos o resultado da sindicância e a apuração dos eventuais culpados".
Eldorado do Sul
Quantos: três investigados
O Gaeco fez buscas para averiguar desvio de donativos que teriam sido, em tese, praticados por três pessoas ligadas à Defesa Civil municipal. Eles foram afastados das funções.
Dois dos investigados atuavam como secretários do município e pré-candidatos nas próximas eleições: Gelson Antunes Santos e João Carlos Ferreira, ambos do PDT.
Santos, pastor evangélico e fundador de um centro de recuperação de dependentes químicos, era até maio secretário da Educação, cargo do qual se desligou para se tornar candidato a prefeito, pela situação.
Ferreira, secretário de Habitação, seria candidato a vereador, cargo que já ocupou por três vezes, mas afirma ter desistido da candidatura. Eles são suspeitos de direcionar a entrega de donativos. O terceiro investigado é um servidor da Defesa Civil.
À reportagem, Santos diz que encontraram em sua residência poucos donativos, aos quais ele teria direito porque vem abrigando sua enteada, que teve a casa completamente inundada pela cheia.
Ferreira diz que não sabe por que é investigado e atribui a apuração a fofocas de opositores políticos, mas decidiu abandonar a candidatura "por desgosto".
Palmares do Sul
Quantos: cinco investigados
Gaeco e Polícia Civil fizeram busca e apreensão na residência do vereador da situação Manoel Antunes Neto (PL). Encontraram cinco cestas básicas e 33 escovas de dente que deveriam ter sido doadas.
Ele é ex-presidente de uma colônia de pescadores e também é investigado por usar conta bancária pessoal para receber valores de benefícios governamentais para os pescadores, como o auxílio-defeso.
Antunes não foi localizado pela reportagem. À polícia, ele disse que as cestas foram obtidas junto aos postos oficiais de distribuição pela sua companheira, que teria sido atingida pela cheia.
Um secretário municipal e uma outra pessoa também sofreram buscas, mas não foram encontrados donativos em seus domicílios.
Numa segunda etapa, o Gaeco focou em dois vereadores de oposição. Um deles é Filipe Lang (PT), pré-candidato a prefeito de Palmares do Sul. Ele intermediou o recebimento de dois caminhões carregados com 18 toneladas de donativos do governo federal e gravou a ação em vídeo. Parte da carga teria sido enviada a áreas que não sofreram enchente, segundo os promotores de Justiça.
Outra parte foi armazenada numa lancheria no distrito de Quintão, base eleitoral do candidato a vice-prefeito na chapa de Lang, o também vereador Polon Backes de Oliveira (União Brasil). A chave do estabelecimento estava com familiar de Polon.
Lang chegou a ser preso por manter em casa uma arma não registrada, mas pagou fiança e foi solto. Os dois vereadores negam qualquer irregularidade e asseguram ter intermediado repasses de donativos a famílias muito necessitadas. Eles ressaltam que mais de 3 mil pessoas buscaram Palmares do Sul para se refugiar das enchentes e isso gerou uma crise social no município.
Lang e Polon argumentam que as cestas básicas foram para carentes que ficaram sem serviço e sem assistência em maio, que também são vítimas da catástrofe, e que a lancheria foi usada apenas como depósito para receber os repasses.
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